Estruturas de cascas de moluscos revelam como eram a vida e a rotina dos índios paranaenses, há 10 mil anos
Comunidades que habitaram o litoral paranaense há cerca de 10 mil anos, deixaram parte de suas histórias guardadas em pelo menos 340 sambaquis, sítios arqueológicos formados por cascas de moluscos, que estão espalhados por todos os municípios da região. Mais do que um simples amontoado de conchas, tais estruturas ajudam a contar como foi a evolução do estado por meio da moradia, da alimentação e dos rituais religiosos de nossos antecessores.
As grandes montanhas – algumas passam dos 30 metros de altura – localizadas próximas aos rios e às baías logo chamaram a atenção dos europeus no período de colonização, durante o século 16. A curiosidade estendeu-se até meados do século 20, quando foram realizados os primeiros estudos de especialistas. As dúvidas eram referentes à formação natural dos sambaquis ou se eles foram criados pelas próprias comunidades, que utilizaram os restos dos alimentos que vinham das águas. “A criação pode não ter sido intencional, mas facilitou muito a vida dos habitantes. A elevação do sambaqui era estratégica para a visualização do inimigo, possibilitava a ventilação e afastava os insetos”, afirma a técnica do setor de arqueologia do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Paraná, Alessandra Spitz.
Os estudos revelaram comunidades complexas e numerosas, devido ao número de sepultamentos nos sambaquis (com grande potencial de preservação devido ao cálcio das conchas). “A população tinha consciência ambiental, pois sabia que a quantidade de alimento do local supria determinado número de pessoas. Quando ocorria a escassez de recursos, os habitantes iam para outro lugar”, explica Alessandra. A oscilação no nível do mar que, com o passar dos anos, recua e avança pela costa, também contribuiu com a movimentação das comunidades pelo litoral. Este fator leva os estudiosos a acreditarem que os sambaquis mais antigos estejam submersos.
Protegidos
A legislação federal impedindo que os sambaquis sejam devastados, só entrou em vigor em 1961, mas não evitou que muitos sítios desaparecessem. Durante a colonização do estado, as estruturas foram utilizadas na construção das cidades históricas como Paranaguá e Morretes, em que as conchas eram queimadas para a produção de cal e argamassa. A poucos metros do sambaqui de Guaraguaçu, em Pontal do Paraná, ainda há a estrutura do forno de caieiras, que abasteceu a produção de cal das edificações parnanguaras. Séculos depois da construção das cidades, as rodovias estaduais do litoral também foram pavimentadas com sambaquis.
Apesar da legislação vigente, a falta de fiscalização e o tamanho do território do litoral paranaense, onde os sambaquis estão localizados, dificultam a integridade dos sítios. Visitantes sobem nas estruturas ou levam parte do material para casa. A construção de obras em locais onde estão os sambaquis contribui para a devastação. Muitas estrutras não são sequer notificadas.
Para evitar novas perdas, o Iphan investe na educação patrimonial junto às comunidades e conta com o apoio de pessoas que informam os achados. Os municípios e pesquisadores também reforçam fundamental a realização de visitas apenas com acompanhamento especializado e, para evitar mais depredação, dificilmente divulgam a localização dos sambaquis.
Outro fator que também prejudica a manutenção dos sítios é a falta de estudos na área. O último levantamento estadual indica sambaquis “com boas condições em 1949”, sem atualização. “É uma vergonha”, avalia a arqueóloga do Museu Paranaense, Cláudia Inês Parellada, que está à frente de um novo levantamento. Porém, ao mesmo tempo em que o grande território impede maior fiscalização das ações contra os sítios históricos, a arqueóloga acredita que muitos sambaquis ainda serão descobertos. Ela prevê, confiante, que nos próximos 20 anos serão 500 sítios paranaenses cadastrados, mas que só serão mantidos com a colaboração da comunidade na sua preservação.
Por: CAROLINA GABARDO BELO
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